Houve um tempo na história da Humanidade, entre
cerca de 30 000 a 3000 a.C. em que a Grande Deusa regia
toda a Vida. Nestas sociedades matriarcais do Neolítico, que floresceram cultural e socialmente e onde o paradigma vigente era o de vencedor -vencedor, a Mãe Terra, a Natureza, era o corpo da Deusa. A Grande Mãe era adorada e os seres humanos viviam em maior harmonia consigo mesmos e com a força vital.
Nas Américas, Ela era Pachamama; Ixchel para os Maias;
Mawu em África; Ísis no Egipto; Inana, Ishtar ou Astarte no
Médio Oriente; Kubaba na Turquia ou Cibele na Frigia (Anatólia, Turquia atual). Estas sociedades possuíam uma cosmovisão profundamente associada à sacralização da Vida, aos ciclos da Deusa -tríplice donzela, mãe, anciã, da Lua, da mulher, da Natureza, da consciência e dos seres vivos. Na Grande Mãe (Deméter) mulheres e homens comungavam com o sagrado; as mulheres eram símbolos vivos da Deusa, no seu próprio corpo e sangue, ciclos, sexualidade, gravidez, maternidade.
As mulheres eram sacerdotisas mediadoras entre o sagrado e o humano, celebrantes de rituais que sacralizavam a vida quotidiana das populações, desde o nascimento à morte. Eram curadoras, conhecedoras de plantas curativas, parteiras do nascimento e da morte, e da Alma, xamãs dos mistérios da visão espiritual. A identidade humana estaria ligada à totalidade, à unidade fundamental da Vida/Mãe, neste estágio do seu desenvolvimento psíquico.
A partir da Idade do Bronze (3300 a.C.) e na Idade do Ferro, dá -se gradualmente o declínio destas sociedades e uma importante mudança de paradigma aconteceu nas sociedades humanas. As sucessivas invasões dos “kurgas”, tribos guerreiras caçadoras dos mares Cáspio e Negro, dizimaram e transformaram radicalmente a vida pacífica dos povos adoradores da Deusa. Como refere Riane Eisler em O Cálice e a Espada, “o mito original do divino feminino é intencionalmente deturpado ou destruído; o primado da força física, dureza, afirmação violenta, substitui a eminização do espiritual”.
As sociedades tornam -se mais belicosas, hierarquizadas, intolerantes e competitivas; uma nova espiritualidade e uma nova cosmovisão impõem -se durante milénios, pela lei do mais forte no domínio patriarcal que tão obscurantista tem sido.
O Sagrado Feminino é a espiritualidade emergente dessas antigas tradições matriarcais. A sua reemergência desde os inconscientes individual e coletivo, para onde foi “desterrada” durante o patriarcado, acompanha o processo inequívoco de profunda mudança de paradigmas, que está a ser colocado como desafi o e oportunidade à nossa civilização atualmente.
Trabalho com o Sagrado Feminino desde 2005, em Portugal, Brasil, Irlanda e, mais recentemente, na Ásia, e feminina e arquetípica estão a crescer extraordinariamente no Mundo, como sinal dessa vital transição paradigmática.
Os valores femininos da função sentimento, reabilitação da sabedoria intuitiva, cooperação com respeito pela diferença, negociações baseadas no princípio “vendedor -vencedor” em vez do patriarcal “vencedor -vencido”, a defesa incondicional da vida, são necessários mais do que nunca. O Sagrado Feminino reabilita as funções do hemisfério esquerdo do cérebro, o intuitivo sintético, não -verbal, artístico, holístico; resgata a matéria, o corpo, o instinto, da sua penosa e devastadora condição medieval, reconhecendo -a tão sagrada como o espírito; insta -nos a integrarmos a sombra – essa parte da nossa psique reprimida, negada, desconhecida, para que haja totalidade, individuação, iluminação.
Vera Faria Leal
Livro do Oráculo do Sagrado Feminino de Vera Faria Leal.
Uma edição do Castor de Papel/4Estações
o que constato é que a espiritualidade da Deusa e a psicologia
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